sexta-feira, 21 de abril de 2017

Maior sol artificial do mundo vai produzir hidrogênio


Maior sol artificial do mundo vai produzir hidrogênio
O sol artificial tem a altura de um prédio de três andares. [Imagem: DLR]

Sol artificial
A Agência Espacial Alemã (DLR) inaugurou o que seus projetistas estão chamando de "o maior Sol artificial do mundo".
Trata-se de uma gigantesca estrutura - da altura de um prédio de três andares - formada por um conjunto de lâmpadas de xenônio, como as usadas nos projetores de cinema, capaz de gerar temperaturas de até 3.000º C.

Cada um dos 149 "favos de mel" que compõem o laboratório, chamado Synlight, é um concentrador parabólico projetado para focalizar toda a luz da lâmpada de xenônio com um mínimo de perda.
O conjunto inteiro foi projetado para que a luz de todos os favos se concentre em um pequeno espaço de 20 x 20 centímetros, produzindo uma luminosidade que imita a luz natural do Sol - só que com uma intensidade equivalente a 10.000 vezes a luz solar que normalmente atinge a mesma superfície.

Produção de hidrogênio
Embora possa ser usado em uma multiplicidade de aplicações - no teste de células solares e equipamentos espaciais, por exemplo - o grande objetivo do Synlight é desenvolver novas formas de produzir hidrogênio.

O hidrogênio é um combustível tido como ideal porque sua queima não produz gases de efeito estufa - na verdade, sua combustão só produz água. Mas o gás é raro na Terra e produzi-lo a partir da eletrólise da água gasta energia demais - energia esta que emite gases de efeito estufa.

A saída então é produzir o chamado "hidrogênio solar", um termo que se refere à produção de hidrogênio aqui na Terra usando a energia do Sol, seja sua porção termal, por aquecimento, seja sua porção óptica, por meio de células solares.
Maior sol artificial do mundo vai produzir hidrogênio
[Imagem: DLR]
 
Termossolar
A expectativa da DLR é que o sol artificial, que consome 350 kilowatts, permita que ao menos alguns dos avanços obtidos até agora em laboratório para produção de hidrogênio solar sejam transformados em processos de nível industrial.

"O Synlight preenche uma lacuna na qualificação de componentes e processos termossolares. A escala do novo sol artificial está entre os sistemas de laboratório e as instalações técnicas de grande escala, como as torres solares," disse Kai Wieghardt, um dos projetistas da estrutura.

Além disso, o laboratório permitirá testar componentes e processos sem interrupção, como ocorreria se a equipe dependesse da luz natural do Sol, e simular a vida útil desses componentes e processos a longo prazo.

Tragédia em Mariana: Reflorestar os 40 mil hectares da área afetada exigirá até 20 milhões de mudas



Mariana/MG - Rompimento da barragem do Fundão completa um ano (Roberto Franco/UFMG)
O rompimento da barragem de Fundão provocou devastação da vegetação nativa. Foto: Léo Rodrigues/Agência Brasil
 

ABr
Para reflorestar os 40 mil hectares de vegetação impactados pela tragédia de Mariana (MG) serão necessários até 20 milhões de mudas nativas, principalmente da Mata Atlântica. Essa é a estimativa inicial da Fundação Renova, criada pela mineradora Samarco para gerir as ações de reparação dos danos causados no episódio. Para atender a demanda, teve início neste mês um levantamento dos viveiros de mudas existentes ao longo da bacia do Rio Doce.


A tragédia de Mariana ocorreu em 5 de novembro de 2015, quando o rompimento na barragem de Fundão, pertencente à mineradora Samarco, liberou no ambiente mais de 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos. Além de devastar a vegetação nativa, a lama poluiu a bacia do Rio Doce, destruiu comunidades e provocou a morte de 19 pessoas. O episódio é considerado a maior tragédia ambiental do país.


O plano de restauração florestal prevê o plantio direto de 10 mil hectares. Nos demais 30 mil hectares, seria conduzida uma regeneração natural. O trabalho também abrangerá 5 mil nascentes, que receberão o plantio de árvores no entorno.


A Fundação Renova estima que apenas a compra das mudas possa chegar a R$ 50 milhões. O mapeamento dos viveiros será feito em duas etapas. Inicialmente estão sendo reunidos dados como as localizações de cada um, tempo de atuação e listas das espécies produzidas. Num segundo momento, os viveiristas serão entrevistados sobre sua capacidade produtiva e detalhes técnicos.


Em nota, a Fundação Renova afirma que o envolvimento dos viveiros locais neste processo contribuirá para estruturar uma cadeia produtiva do reflorestamento na região, com capacidade de se manter sustentável e atender uma variada gama de clientes que vão desde pequenos agricultores rurais até grandes empresas situadas na bacia do Rio Doce. “Serão firmadas parcerias para capacitar os trabalhadores do setor, melhorar as instalações físicas dos viveiros, promover o alinhamento à legislação de produção de mudas e identificar as sementes nativas, gerando uma nova vocação econômica para a região”, acrescenta o texto.


Reflorestamento
Os trabalhos de reflorestamento da área afetada pela tragédia são acompanhados pelo Comitê Interfederativo, que é composto por diversos órgão públicos e tem como objetivo fiscalizar os trabalhos de reparação dos danos causados pela tragédia. Sua criação foi definida em acordo celebrado entre a Samarco, suas acionistas Vale e BHP Billiton, o governo federal e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo.


De acordo com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), um dos órgãos à frente do Comitê Interfederativo, o principal trabalho até o momento envolveu uma revegetação inicial com gramíneas e leguminosas para combater a erosão e estabilizar o solo. O cronograma e os detalhes do plantio definitivo ainda serão tratados em reuniões. A expectativa do órgão é que esse trabalho seja iniciado durante o período chuvoso deste ano, nos meses de setembro e outubro, época considerada mais adequada.


Segundo a Fundação Renova, está previsto para setembro o início do plantio de árvores em uma área de 2 mil hectares entre a barragem de Fundão e a Usina de Candonga, em Santa Cruz do Escalvado (MG). Este é um projeto que corre em paralelo ao reflorestamento da área total de 40 mil hectares e envolve trechos abrangidos pela deposição de rejeitos nas calhas e margens dos rios Gualaxo do Norte, Carmo e Doce.


Para tanto, foram realizados testes piloto em três fazendas, com o objetivo de entender o comportamento das espécies florestais em diversos aspectos técnicos. Os resultados balizarão a tomada de decisão sobre as espécies, condições de solo e metodologia de plantio. Além disso, até dezembro de 2017, a Fundação Renova promete realizar um plantio compensatório em uma área de 785 hectares onde há 500 nascentes.


Por Léo Rodrigues, da Agência Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 20/04/2017

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Finalmente: Um impermeabilizante que dura

Finalmente: Material repelente à água que se autoconserta
O material resistiu a todos os tipos de ataque que os pesquisadores conseguiram imaginar, permanecendo hidrofóbico. [Imagem: Joseph Xu/University of Michigan]
Resiste a quase tudo
Embora vários materiais super-hidrofóbicos - altamente repelentes à água - venham sendo sintetizados ao longo dos anos, poucos deles passaram dos laboratórios para as prateleiras por que eles perdem sua super-hidrofobicidade muito facilmente, principalmente pelo atrito.
Sabendo disso, Kevin Golovin e Anish Tuteja, da Universidade de Michigan, nos EUA, partiram para fabricar um material repelente à água que fosse capaz de se autoconsertar depois de sofrer algum dano.



O resultado saiu melhor do que o esperado.
O novo material resistiu com galhardia a testes de resistência que incluíram abrasão com pedra de esmeril, riscamento com ferramentas metálicas, fogo, jato de plasma, dobradura, sonicação e ataques químicos.



"A maioria dos pesquisadores de ciência de materiais tem-se concentrado na identificação de um sistema químico específico que seja tão durável e repelente à água quanto possível. Nós abordamos o problema de forma diferente, medindo e mapeando as propriedades químicas básicas que dão durabilidade ao revestimento repelente à água. E alguns dos resultados nos surpreenderam," confessou Golovin.



Durabilidade e autoconserto
O que Golovin descobriu é que, ainda mais importante do que a durabilidade, é uma propriedade chamada "miscibilidade parcial", ou a capacidade de duas substâncias para se misturarem parcialmente. A outra variável-chave que a equipe descobriu é a estabilidade da superfície repelente à água.



Quase todos os revestimentos repelentes de água funcionam porque sua superfície tem uma geometria muito específica, geralmente pilares microscópicos. As gotas caem nas pontas destes pilares, criando bolsas de ar por baixo que impedem que a água alcance uma superfície sólida onde possa assentar, o que mantém as gotas coesas e faz com que rolem. Mas essas superfícies tendem a ser frágeis, e uma abrasão fraca - até mesmo a própria pressão da água - pode danificá-los.



Golovin descobriu que uma superfície que seja ligeiramente flexível pode escapar dessa armadilha. Mesmo que pareça menos durável, suas propriedades flexíveis lhe permitem recuperar-se dos danos - os testes mostraram que o material se autorrepara centenas de vezes.

Finalmente: Material repelente à água que se autoconserta
No detalhe, o teste realizado na superfície do material depois de uma forte abrasão. [Imagem: Kevin Golovin et al. - 10.1021/acsami.6b15491]
Já para o mercado
Dado o interesse de empresas na pesquisa, a equipe estima que seus revestimentos duráveis estarão disponíveis para uso até o final deste ano para aplicações que incluem tecidos repelentes à água e revestimentos e impermeabilizantes por pulverização (spray) que poderão ser adquiridos diretamente pelos consumidores.

Mais no futuro, eles esperam que possam atender a aplicações que estão na lista de espera há mais tempo, como revestir cascos de navios e fuselagens de aviões, mudando o perfil desses setores de transporte.
Bibliografia:

Designing self-healing superhydrophobic surfaces with exceptional mechanical durability
Kevin Golovin, Mathew Boban, Joseph M. Mabry, Anish Tuteja
Applied Materials & Interfaces
Vol.: 9 (12), pp 11212-11223
DOI: 10.1021/acsami.6b15491

OutoBot: Um robô para limpar e pintar edifícios


OutoBot: Robô limpa e pinta edifícios
Sem os trabalhadores, a gôndola ficou mais leve, consumindo menos energia.[Imagem: NTU]
 
Manutenção robótica
Engenheiros da Universidade Tecnológica de Nanyang, em Cingapura, criaram o OutoBot, um sistema robotizado de manutenção para trabalhar nas áreas externas dos edifícios.
O robô pode limpar o exterior dos edifícios, por meio de jatos de água, e aplicar novas camadas de tinta - tudo de forma automática e contínua.

A parte principal do OutoBot é um braço robótico com seis graus de liberdade. Uma câmera faz uma varredura da superfície para identificar quais áreas podem receber o jato de água e quais deverão receber a tinta.

Enquanto o esquema tradicional exige uma equipe de cinco trabalhadores - um no solo, um no telhado e três na gôndola -, o OutoBot exige apenas um operador no solo.

"Usando nosso robô, nós demonstramos que um emprego intensivo em trabalho pode ser transformado em um que pode ser facilmente executado por um trabalhador mais velho, e ao mesmo tempo eliminando o risco dos trabalhadores que precisam trabalhar nas alturas," defende-se o professor Dennis Lim quanto ao desemprego gerado por sua criação.

"Nosso objetivo é tornar a limpeza e a pintura de prédios mais fáceis, mais seguras e mais econômicas. O robô também é mais preciso e mais eficiente, minimizando desperdício e poupando tinta," acrescentou seu colega Chen I-Ming.

OutoBot: Robô limpa e pinta edifícios
Os engenheiros optaram pela pintura a ar-comprimido, controversa para uso em edifícios por espalhar tinta pela vizinhança. [Imagem: NTU]
 
Sem os trabalhadores, foi possível também reduzir o peso da gôndola, que exige apenas metade da energia necessária para movimentar o sistema tradicional.

A dupla afirma que seu robô já foi testado em um edifício da universidade e está pronto para ir ao mercado.

Telhado extra dá eficiência energética à casa


Como um telhado extra pode mudar a eficiência energética de uma casa
O segredo da eficiência energética está no telhado adicional em formato de V.[Imagem: University of Malaya]
 
Casa energeticamente eficiente
O professor Wen Tong Chong, da Universidade da Malásia, acredita ter encontrado o projeto ideal para uma casa mais ambientalmente correta em regiões tropicais.

Seu objetivo foi obter um equilíbrio entre um "conflito ambiental" que incomoda os arquitetos: como conciliar a crescente demanda de conforto, com seu natural consumo de energia, e a necessidade de reduzir o consumo de energia por conta das mudanças climáticas.

Usar fontes renováveis de energia e aproveitar as variações naturais do clima parece ser uma resposta adequada, mas falar é mais fácil do que fazer.

Chong então idealizou um telhado superior em formato de V, que se projeta acima do telhado tradicional, criando as condições para gerar energia e aproveitar a iluminação natural.

Telhado inteligente
A estrutura em V coleta o vento e o dirige para uma série de turbinas situadas logo abaixo, gerando eletricidade.

A estrutura também aumenta o fluxo de ar dentro da casa por meio de aberturas construídas no telhado tradicional, melhorando a ventilação natural.

Além disso, um coletor de água da chuva é conectado a um sistema automatizado de resfriamento e limpeza que lava as células solares embutidas no telhado secundário, para manter seu nível de eficiência.

Finalmente, claraboias transparentes iluminam as áreas principais dentro da casa durante o dia, reduzindo a necessidade de iluminação artificial.
Como um telhado extra pode mudar a eficiência energética de uma casa
A estrutura conta com geradores eólicos, painéis solares com limpeza automática, coletores de água da chuva e tetos solares. [Imagem: University of Malaya]
 
Ganhos energéticos
Chong afirma que seu telhado adicional poderia suprir as necessidades de uma família de seis pessoas, gerando 21,20 quilowatts (kWh) de energia, e economizando outros 1,84 kWh por conta dos tetos solares.

Além disso, o sistema de ventilação poderia movimentar, em termos anuais, cerca de 217 milhões de metros cúbicos de ar e reduzir as emissões de dióxido de carbono em 17.768 quilogramas, enquanto o coletor de água da chuva poderia coletar cerca de 525 metros cúbicos de água.

Rumo ao cérebro artificial, sinapses eletrônicas já aprendem sozinhas

Rumo ao cérebro artificial, sinapses eletrônicas já aprendem sozinhas
Impressão artística da sinapse eletrônica: as partículas representam elétrons que circulam através de um óxido, em analogia com os neurotransmissores nas sinapses biológicas. O fluxo de elétrons depende da estrutura do domínio ferroelétrico do óxido, que é controlada por pulsos elétricos. À direita, estrutura do componente real.[Imagem: Sören Boyn/CNRS/Thales]

Aprendizado de máquina autônomo
Pesquisadores franceses criaram uma sinapse artificial capaz de aprender sozinha, sem que os humanos precisem se dedicar ao tedioso trabalho de treiná-la para que ela aprenda a executar suas funções.

Este é um passo importante para a criação de circuitos biomiméticos mais complexos, inspirados no funcionamento do cérebro.

O processo de aprendizagem do cérebro está ligado às sinapses, que servem de ligação entre os neurônios. Quanto mais a sinapse é estimulada, mais a conexão é reforçada, melhorando a aprendizagem.

Soren Boyn e seus colegas do CNRS imitaram esse conceito usando um tipo especial do já bem conhecido memoristor, um componente que também consegue se lembrar das correntes elétricas que já o percorreram anteriormente, o que faz com que ele funcione como uma espécie de sinapse artificial.


O que a equipe conseguiu fazer de novidade foi desenvolver um modelo físico capaz de prever como a sinapse artificial irá funcionar. Esse entendimento do processo, escrevem eles, tornará possível criar sistemas mais complexos e "máquinas mais inteligentes", tirando proveito de uma série de memoristores interconectados.

"Com base neste modelo físico, nossas simulações mostram que as matrizes de nano-sinapses ferroelétricas podem aprender autonomamente a reconhecer padrões de forma previsível, abrindo o caminho para a aprendizagem não-supervisionada em redes neurais," escreveu a equipe.


Câmera inteligente
O próximo passo será testar se o modelo funciona realmente e, para isto, o grupo está trabalhando em um conceito inovador de uma câmera que será dotada de um sensor inteligente, que aprenderá como lidar com a luz.


Se tudo funcionar como eles planejam, os píxeis do sensor da câmera ficarão inativos até que detectem uma mudança no ângulo de visão, quando então se ativarão autonomamente.
Os ganhos esperados são que a câmera leve menos tempo para detectar objetos selecionados e consuma menos energia, já que os píxeis ficarão mais desligados do que ligados.


Bibliografia:

Learning through ferroelectric domain dynamics in solid-state synapses
Sören Boyn, Julie Grollier, Gwendal Lecerf, Bin Xu, Nicolas Locatelli, Stéphane Fusil, Stéphanie Girod, Cécile Carrétéro, Karin Garcia, Stéphane Xavier, Jean Tomas, Laurent Bellaiche, Manuel Bibes, Agnès Barthélémy, Sylvain Saïghi, Vincent Garcia
Nature Communications
Vol.: 8: 14736
DOI: 10.1038/NCOMMS14736

Fogo na várzea ameaça a toda floresta


Por Vandré Fonseca
Igapós atingidos pelo fogo no Rio Cuiuini, Bacia do Rio Negro, Amazonas. Floresta alagada demora mais para se recuperar após incêndios e permanece mais vulnerável. Crédito: Bernardo Flores.
Igapós atingidos pelo fogo no Rio Cuiuini, Bacia do Rio Negro, Amazonas. Floresta alagada 
demora mais para se recuperar após incêndios e permanece mais vulnerável. 
Crédito: Bernardo Flores.

Manaus, AM -- Igapós e várzeas amazônicas são mais susceptíveis aos danos provocados por incêndios ao longo do tempo do que a floresta em terra firme. Esta é a conclusão de um estudo publicado esta semana pelo biólogo brasileiro Bernardo Flores, com a colaboração de outros pesquisadores, na revista científica Proceedings of National Academy of Science (PNAS). O autor aponta ainda que este é um fator de risco até mesmo para regiões da Amazônia hoje consideradas mais protegidas dos impactos do aquecimento global.

No artigo, produzido durante o doutorado de Flores na Universidade Federal do Rio Grande do Norte e na Wageningen University da Holanda, ele usou um mapa das áreas da Amazônia que durante parte do ano ficam submersas e comparou a cobertura de árvores destes locais com a floresta de terra firme. Enquanto as árvores cobrem cerca de 93% da área em florestas de terra firme, nas áreas alagáveis esse percentual é de 66%. “Você tem cinco vezes mais chances de ter uma savanização, ou seja, é substituída por uma vegetação mais aberta, com menos árvores, nas áreas alagáveis do que na terra firme”, afirma o pesquisador.

Em um estudo anterior, concluído em 2011, Bernardo Flores já havia demonstrado a fragilidade das florestas de igapó, áreas inundáveis, diante incêndios florestais. Na vazante do rio, o material orgânico depositado no chão ao longo destas áreas seca e pode se tornar combustível para grandes incêndios. Basta a ignição. E o fogo pode atingir também as áreas mais altas.
Crédito: Bernardo Flores.
Crédito: Bernardo Flores.

As regiões úmidas na Amazônia são mais vulneráveis também a redução das chuvas. De acordo com Flores, estudos indicam que a floresta de terra firme pode sofrer o processo de savanização quando chuvas caem a cerca de 1 mil milímetros anuais, nas áreas alagadas esse processo ocorre mesmo com um clima mais úmido, com 1,5 mil milímetros anuais. Em Manaus, por comparação, as chuvas anuais geralmente ficam em torno de 2,2 mil milímetros.

Flores alerta que os impactos sofridos pelas áreas inundáveis podem se espalhar por toda floresta amazônica. Ele explica que as várzeas e igapós acompanham justamente os rios que formam a Bacia Amazônica e se concentram principalmente no centro e a oeste, podem ser um caminho para que a degradação avance até regiões bem protegidas. “Isso aumenta as chances das chamas se espalharem onde as florestas hoje são consideradas mais resilientes, afetando a resiliência de toda a Amazônia”, afirma.

Outras duas consequências importantes da degradação das áreas alagáveis são destacadas pelo pesquisador: uma para a atmosfera e outra para a economia e sustento de populações amazônicas. Várzeas e igapós são um ambiente importante para os peixes, que durante a cheia encontram alimento, como frutos, nessas áreas. A perda destes habitats, segundo Flores, pode afetar toda a cadeia alimentar. Além disso, a perda de árvores significa também redução nos estoques de carbono e consequente aumento de gases de efeito estufa.

Saiba Mais
Artigo: “Floodplains as an Achilles’ heel of Amazonian forest resilience,” by Bernardo Flores et al.

Parque que pode ser extinto abriga fazendas de Padilha


Por Daniele Bragança
A exuberância da paisagem do Parque Estadual Serra de Ricardo Franco, que poderá deixar de ser área protegida. Foto: Renato Moreira/Wikiparques.
A exuberância da paisagem do Parque Estadual Serra de Ricardo Franco, que poderá deixar de ser área
 protegida. Foto: Renato Moreira/Wikiparques.


Na noite de ontem (19), a Assembleia Legislativa de Mato Grosso aprovou, em primeira votação, a extinção do Parque Estadual Serra Ricardo Franco, criado há 20 anos. Parte da área protegida de 158,6 mil hectares é ocupado por grileiros e por donos legítimos da terra. O governo iniciou um levantamento para separar quem era dono antes de criação da unidade e quem era invasor. O objetivo era regularizar a situação fundiária do parque, mas os deputados estaduais resolveram acabar com a unidade e deixar todos por lá mesmo, donos legítimos e grileiros.


Um dos donos de fazendas dentro do parque é o atual ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha (PMDB), que possui quatro propriedades no local, como mostra uma reportagem do Cauê Ameni, no “De Olho nos Ruralistas”. Segundo a reportagem do “De olho nos Ruralistas”, elas foram adquiridas depois da criação do parque, entre 2006 e 2013. Existem outras fazendas no parque além dessas. Em 2015, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) começou a organizar as informações para saber quais propriedades existiam antes da criação do parque, e, portanto, eram de donos legítimos, e quais apareceram depois.


A ideia era expulsar os grileiros e regularizar os donos, ora indenizando, ora vendendo a propriedade para outros proprietários rurais que precisassem compensar a reserva legal que haviam desmatados. A regularização fundiária, que preservaria um dos parques mais importantes do estado, que abriga espécies endêmicas, cachoeiras e uma fauna riquíssima nem chegou a ser concluída: o legislativo estadual preferiu fabricar um decreto legislativo que simplesmente acaba com a área protegida.
Um decreto legislativo não necessita da assinatura do governador Pedro Taques (PSDB) para ser sancionado e nem pode ser vetado pelo Executivo.


Apresentado pelas “lideranças partidárias”, o decreto que susta a criação do Parque usa como justificativa já que a Unidade de Conservação é uma das mais desmatadas do estado, “não cumpriu os requisitos necessários para sua efetiva implantação” e, portanto, deve deixar de existir.
O decreto segue agora para a Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR). De lá volta para o plenário onde haverá a votação em segundo turno. Caso aprovado pela segunda vez, o Parque Estadual Serra Ricardo Franco estará extinto.