terça-feira, 8 de novembro de 2016

Elefantes no Cerrado, um equívoco


Por Yara de Melo Barros
Elefante no zoológico de San Diego, Califórnia. Foto: Wikimedia
Elefante no zoológico de San Diego, Califórnia. Foto: Wikimedia



Quem acessar o site do Santuário de Elefantes Brasil vai descobrir que eles criaram, em uma área de Cerrado, no Mato Grosso, um "santuário" para receber elefantes da América Latina. Tem sido difundida a ideia de que neste local os elefantes estarão "em liberdade". O site da instituição menciona que mesmo bons zoos "não são uma opção viável" para elefantes. A justificativa seria que as limitações de "espaço e capacidade" impactam a qualidade de vida dos elefantes.



A informação é equivocada. Bons zoos podem sim manter elefantes com excelente qualidade de vida. O espaço é só uma das variáveis que influenciam a qualidade de vida dos elefantes. Também precisam ser avaliados alojamento, cuidado, saúde física, interações com humanos, genética e história de vida.


Na verdade, há um estudo abrangente e pioneiro sobre bem-estar de elefantes em zoos realizado pela Universidade da Califórnia, que envolveu 255 elefantes em 70 zoos, e uma equipe de 5 especialistas em manejo de elefantes e 19 cientistas (além de pesquisadores, consultores, estudantes e técnicos). Este estudo visou entender os fatores que influenciam o bem-estar dos elefantes. Com base nos resultados, bons zoos podem agir para melhorar a vida dos animais sob seus cuidados. Os resultados desta pesquisa indicaram que as interações sociais e as oportunidades de interagir com seu ambiente podem ser mais importantes para o bem-estar de elefantes do que espaço.


Sempre reforço: o que faz realmente a diferença para os animais mantidos sob cuidados humanos é a excelência no manejo, e não a ausência de público ou o nome que é dado ao local (a eterna discussão sobre zoos x santuários).


Aliás, a ideia de ter elefantes caminhando livres e felizes pelo Cerrado é ingênua: elefantes precisam de cuidados constantes, independente do tamanho do recinto. E por constantes, leia-se diários. Bons zoos têm que fornecer cuidados diários: cada animal deve ser checado, treinado e receber cuidados nas patas. Para que isso seja feito, são necessárias sessões diárias de treinamento e condicionamento. Uma vez sob cuidados humanos, devem ser examinados diariamente. 



"(...) o que faz realmente a diferença para os animais mantidos sob cuidados humanos é a excelência no manejo, e não a ausência de público ou o nome que é dado ao local."
 
 
 
No Brasil, os zoos que mantém elefantes receberam treinamento sobre seu manejo em um workshop intensivo que foi ministrado por Frank Carlos Camacho, CEO do Africam Safari no México e presidente da International Elephant Foundation. Agora cabe a cada instituição aplicar o que foi ensinado e melhorar a vida dos animais sob seus cuidados. 



Instituições que não tenham excelência no manejo e recursos para investir no manejo apropriado de elefantes e não possam fornecer um alto grau de bem-estar devem fazer a opção responsável de não manter estes animais. Isso vale inclusive para este mantenedouro no Cerrado.



Considerando que aparentemente a instituição vai sobreviver de doações, eu me pergunto o que acontecerá com os animais nos meses em que, digamos, as doações não aparecerem? Como a estrutura necessária (veterinários, biólogos, tratadores, alimentação, medicamentos, etc..) será mantida?


Vejo com muito, digamos...ceticismo...a criação de um mantenedouro de elefantes que começa dando declarações equivocadas. Em um programa do CQC que foi ao ar há algum tempo, a bióloga responsável nos brindou com várias pérolas. Uma delas foi que "quando você coloca um animal em cativeiro ele deixa de ser um animal, afinal, ele não escolheu estar ali, e não pode escolher o que vai comer". 


Devemos supor então que os elefantes habitantes do "santuário" deixam de ser animais quando chegarem ao local? Ou eles escolheram ir para lá? Eles é que vão definir a própria dieta?
Creio que passou da hora de abandonar o discurso surreal de que "santuário" não é cativeiro. O discurso deste mantenedouro também coloca zoos e circos "no mesmo saco", o que além de apelativo, é inverídico.



Na entrevista, a bióloga disse que os zoos têm mais mortes do que nascimentos e que em zoos animais vivem menos. Na posição de cientista, ela deveria ter à mão dados que comprovem estas estatísticas, e mostrar a fonte, já que, em geral, em zoos animais têm vida mais longa do que na natureza, pois não correm risco de fome e têm as doenças tratadas.



À época da entrevista, a instituição fez uma vaquinha para arrecadar módicos 350 mil (Foram arrecadados cerca de 67 mil). Além do custo de manutenção, há o custo altíssimo de deslocar animais de outros países para o mantenedouro.



Como ajudar os elefantes
A população de elefantes na África apresentou uma queda de 20% em 9 anos, segundo a IUCN, e lá são mortos cerca de 96 elefantes diariamente. É morto um elefante a cada 15 minutos. Elefantes asiáticos e africanos ainda sofrem com a pressão dos conflitos com populações humanas e muitos são mortos.


São necessárias ações urgentes para que elefantes não sejam extintos, e muitos zoos no mundo todo estão trabalhando ativamente para salvar estas espécies.


O contundente documentário "The Ivory Game" (disponível no Netflix com o título "O Extermínio do Marfim", mostra o tamanho do problema que é o comércio ilegal de marfim. Sem a proibição total do comércio legal de marfim, ele vai seguir servindo para "esquentar" marfim ilegal e fomentar mortes e sofrimento. Os Estados Unidos proibiram este ano o comércio de marfim em seu território, mas a China, maior mercado consumidor, ainda não estabeleceu data para a proibição.



A United for Wildlife criou uma campanha, a #WorthMoreAlive (vale mais vivo) para fazer pressão pelo banimento do mercado legal de marfim. Em menos de 10 dias acontecerá a Conferencia de Hanói sobre o Comércio Ilegal de Vida Selvagem, e a campanha quer espalhar a mensagem de conservação dos elefantes e fazer pressão para a proibição do comércio de marfim. É bem bacana, e para participar é só clicar no link, escolher sua foto e se juntar à "manada". Enquanto o comércio de marfim não for banido, é preciso proteger os elefantes investindo forte em proteção, fiscalização e iniciativas, tais como cercas, que minimizem o conflito com populações humanas.



Esta é a forma de investimento de recursos que realmente vai fazer diferença para a conservação de elefantes, e muitos zoos no mundo todo investem recursos para sua conservação na natureza.
Um exemplo aqui na América Latina é o já citado Africam Safari. Eles equipam com GPS, coletes à prova de balas e outros equipamentos os guarda-parques que lutam contra caçadores furtivos na África do Sul. 


A equipe do Africam já passou várias noites escondida entre os espinhos africanos, em operações de repressão à caça de elefantes e rinocerontes. Além disso, trabalham ativamente na Ásia para ensinar os mahouts (montadores de elefantes) a abandonarem técnicas cruéis de treinamento e substituí-las por técnicas de condicionamento operante, que além de não maltratar os elefantes, são prazerosas e estimulantes para os animais. Centenas de mahouts já foram treinados...isso significa que centenas de elefantes tiveram sua vida melhorada graças à ação efetiva de um zoo. 


Quanto ao Santuário de Elefantes Brasil, A escolha do local para a construção do mantenedouro de elefantes foi equivocada: 1.100 hectares de cerrado, um bioma ameaçado e não adaptado à presença deste tipo de animal. O mantenedouro está a cerca de 40 Km do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães. O estrago que será feito nesta área é inevitável.


De acordo com o ICMBio, " o Cerrado é o bioma com a menor porcentagem de áreas sob proteção integral. Apenas 8,21% da área total do seu território é legalmente protegida com unidades de conservação; uma das razões que fazem do Cerrado o bioma brasileiro que mais sofreu alterações com a ação humana. Atualmente a área conta com uma intensa exploração predatória: inúmeros animais e plantas correm risco de extinção e estima-se que 20% das espécies nativas e endêmicas da região já não ocorram em áreas protegidas".



Para as espécies ameaçadas de plantas e animais do Cerrado, cada hectare conta. E poderia ser usado para salvar espécies locais que, não sendo midiáticas, não conseguem dinheiro em vaquinhas digitais.

COP22 abre com apelo a mais compromisso



07/11/2016

Conferência começa três dias após Acordo de Paris entrar em vigor e reforça: estamos longe de atingir metas e momento é de muito trabalho

Salaheddine Mezouar, Presidente da COP22. Imagem: UNclimatechange
Salaheddine Mezouar, Presidente da COP22. Imagem: UNclimatechange
CAMILA FARIA
CLAUDIO ANGELO


Três dias após a entrada em vigor do Acordo de Paris, a COP22, em Marrakesh, começa com “urgência” e “ambição” como palavras de ordem. Durante a plenária de abertura da
 “COP da Ação”, realizada nesta manhã, autoridades explicitaram a necessidade global de agir com rapidez para que os objetivos do acordo possam ser cumpridos, especialmente em prol de nações menos desenvolvidas. O presidente da COP22 Salaheddine Mezouar destacou em sua fala a “oportunidade de ouvir países mais vulneráveis, em particular as nações africanas e das ilhas”, que pouco contribuem para o aquecimento global e sofrem severamente suas consequências.


“A entrada em vigor do Acordo de Paris é uma celebração e um lembrete das altas expectativas sobre nosso trabalho. Os objetivos do acordo não estão garantidos e não devemos subestimar os desafios presentes, precisamos trabalhar rápido”, disse Patricia Espinosa, chefe de assuntos climáticos da ONU. A preocupação é bastante justificável: hoje, emitimos globalmente 52 bilhões de toneladas de CO2 equivalente e precisaremos chegar a 2030 emitindo no máximo 42 bilhões para ter pelo menos dois terços de chance de estabilizar a temperatura em menos de 2 graus.


Durante o evento, que vai até o próximo dia 18, os países devem discutir, entre outros temas, suas próprias contribuições nacionais ao tratado. “Convido todos a sermos mais ambiciosos em nossos compromissos durante os próximos dias”, afirmou Mezouar.
O Brasil chega a Marrakesh com sete propostas para a regulamentação do acordo. Duas tratam das NDCs, uma do mecanismo de tecnologia, uma de transparência no financiamento, uma de adaptação (uma submissão conjunta com a Argentina e o Uruguai) e duas de mecanismos de mercado e comércio de emissões.


Como o OC adiantou em outubro, as propostas sobre mecanismos de mercado visam evitar o lançamento de “créditos podres” de carbono, por meio de uma definição rigorosa do que pode ou não pode ser posto à venda pelos países.


Essa definição pode causar polêmica, pois exclui, por exemplo, créditos de Redd+. ONGs, governos subnacionais e vários países florestais têm defendido que projetos de Redd+ possam gerar créditos num mercado internacional. O governo brasileiro não concorda.



Ademais, no dia 15, a COP22 pode ver alguma tensão política. Essa é a data marcada para a abertura da CMA, a primeira reunião das partes do Acordo de Paris. É quando a determinação internacional que permitiu que o acordo fosse produzido e entrasse em vigor em tempo recorde será testada.


Isso porque os diplomatas não esperavam que a CMA fosse acontecer tão cedo, já que a previsão oficial era de que Paris só fosse entrar em vigor em 2020. Por conta do surpreendente movimento internacional que permitiu o início da vigência na última sexta-feira, o encontro das partes ocorrerá de forma atropelada: países importantes, como Rússia, Canadá, África do Sul e Japão ainda não ratificaram o acordo. E, o principal, o conjunto de regras que permitirão a operacionalização de Paris ainda estará longe de ficar pronto – já que essa conversa começa justamente em Marrakesh.


Por conta disso, a CMA será aberta e logo depois suspensa. A data de retomada será motivo de atrito.



Alguns países defendem a suspensão por dois anos, período no qual a regulamentação seria negociada de modo mais lento. O Brasil defenderá a suspensão por apenas um ano e a retomada em 2017. Aumentando a pressão, crescem as chances de que a regulamentação esteja concluída antes de 2020 – o Brasil quer que isso ocorra em 2018 –, algo importante para que Paris possa de fato entregar uma estabilização do aquecimento global.



“Não podemos dar um sinal contrário a Paris e à mobilização internacional que permitiu que Paris fosse concluído”, disse o negociador-chefe do Brasil, José Antonio Marcondes. “A suspensão por dois anos é contrária a todos os elementos a que me referi”, continuou. “O momento não é de relaxar, é de acelerar a implementação.”

Alta do desmatamento exige mudança no sistema nacional de Redd+



31/10/2016
Queimada na Amazônia (Foto: Greenpeace)
Queimada na Amazônia (Foto: Greenpeace)
NATALIE UNTERSTELL
ALICE THUAULT
MARIANO CENAMO
ESPECIAL PARA O OC


Os dados mais recentes do desmatamento na Amazônia mostram uma tendência alarmante. Depois de uma década de avanços, a taxa voltou a crescer – em tempos de recessão econômica. Entre agosto de 2014 e julho de 2015, 6.207 quilômetros quadrados de floresta foram derrubados, quase um quarto mais do que o ano anterior. É o nível mais alto em quatro anos, segundo o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). E muda a correlação entre crescimento e queda no desmatamento estabelecida por políticas postas em prática de 2005 para cá.



Políticas e iniciativas de mercado ainda estão tendo um impacto positivo e provavelmente contendo taxas ainda maiores. Cerca de R$ 1.2 bilhão foram dedicados a cerca de 80 projetos de desenvolvimento sustentável através do Fundo Amazônia. A moratória da soja celebrou o seu 10º aniversário na semana retrasada. O Ibama e a Polícia Federal têm desmantelado grandes e bem estabelecidos esquemas de crime ambiental, como o dos Junqueira Vilela, no Pará. E grandes empresas têm aderido a esforços relativos a commodities sustentáveis, como o Carne Legal, do Ministério Público Federal no Pará.
Ainda assim, algo não está dando certo. 



O que o Brasil está perdendo de vista?
Em primeiro lugar, o governo cortou 72% do orçamento para o controle do desmatamento entre 2011 e 2014, deixando para o Fundo Amazônia a tarefa de socorrer as agências de comando e controle. A implementação do Código Florestal tem sido lenta e impulsionada por sinais confusos dados pelas autoridades federais. A transparência dos dados do desmatamento foi afetada, com publicação irregular em comparação com a sistemática anteriormente adotada. O plano nacional de controle do desmatamento foi mantido em modo vegetativo, publicado anos após consulta pública e sem qualquer novidade no campo das atividades sustentáveis.




Em segundo lugar, existe uma desconexão entre as políticas nacionais e as ações locais. O governo federal coordena a estratégia de Redd+, mecanismo da ONU para mobilizar a mitigação de gases de efeito estufa associada em áreas de floresta de países em desenvolvimento. No entanto, muitas responsabilidades constitucionais relativas à proteção florestal foram descentralizadas para os governos estaduais no Brasil.




A Estratégia Nacional de Redd+, documento lançado no final de 2015 após o Acordo de Paris, não traz uma única palavra sobre essa divisão de responsabilidades e tampouco sobre alinhar incentivos e repartir benefícios. Incentivos econômicos ainda não chegam até atores locais, ao passo que a implementação de instrumentos como o Programa Nacional de Serviços Ambientais previsto no artigo 41 da Lei 12.651/2012 não foi iniciada.




Em terceiro lugar, o setor privado tem sido tratado como um problema, e não como parte da solução. O governo federal reconhece apenas a tradicional modalidade de ajuda externa ao desenvolvimento como válida para a proteção do carbono florestal. Ignoram-se as oportunidades de orientar investidores privados para a região amazônica ao aproveitamento sustentável das florestas, dos estoques pesqueiros e do potencial agrícola. Enquanto localmente os atores tem clareza sobre a necessidade de monetização de ativos ambientais associados a essas atividades, o governo federal deixa para depois – ou, quem sabe, para nunca – essa questão.



O Ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho (PV-MA), herdou a maioria desses problemas do governo que o antecedeu. Mas ele ainda precisa dar indicações claras de que vai corrigir os rumos dessa política.




Há alguns dias, sua equipe propôs reforçar ainda mais a centralização federal sobre Redd+. Uma proposta de resolução foi rejeitada na Comissão Nacional de Redd+ (Conaredd+). Se aprovada, o Brasil teria se tornado para sempre dependente da capacidade do governo federal de mobilizar a ajuda internacional para proteger seus ativos ambientais.



Se Sarney Filho quer contribuir com um curso de queda do desmatamento, ele precisa reformar o arranjo de Redd+ de modo que os governos subnacionais, os povos indígenas e tradicionais, além de atores privados possam ser premiados por obter resultados reais de mitigação de gases de efeito estufa. Sem essa clara inclusão, a estratégia nacional de Redd+ se manterá incompleta e, portanto, ineficaz.



Nesse sentido, Sarney Filho pode olhar para o Fundo Amazônia para testar novos modelos de pagamentos por resultados e colocar a sua equipe para trabalhar por uma maior integração. Ele poderia começar ouvindo aqueles que têm desenhado sistemas subnacionais de Redd+.



Finalmente, se o desmatamento não estiver na pauta do dia de todas as estruturas governamentais, os sinais do mercado também irão enfraquecer. Os mercados precisam de sinais claros para investir e para sustentar práticas responsáveis. O governo precisa ter uma voz mais clara sobre o assunto, bem como ouvidos abertos para escutar o que os seus parceiros têm a dizer e a ensinar sobre o futuro sem desmatamento.




Natalie Unterstell é bolsista do Centro de Liderança Pública de Harvard
Alice Thuault é diretora-adjunta do ICV (Instituto Centro de Vida)
Mariano Cenamo é pesquisador-sênior do Idesam (Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas)

Quer saber quanto você muda o clima?


03/11/2016

Estudo faz correlação direta entre emissões de carbono pessoais e degelo do Oceano Ártico

e conclui que, a cada tonelada que você emite, Papai Noel perde 3 metros quadrados de sua casa

Gelo marinho derrete no verão no Oceano Ártico (Foto: Claudio Angelo/OC)
Gelo marinho derrete no verão no Oceano Ártico (Foto: Claudio Angelo/OC)
CLAUDIO ANGELO
DO OC


Cada vez que você viaja de avião de ida e volta para a Europa, você derrete três metros quadrados de gelo no polo Norte. A cada 4.000 quilômetros que você roda com seu carro a gasolina, você derrete três metros quadrados de gelo no Ártico. A cada dois meses comendo bife uma vez por dia, você derrete três metros quadrados de gelo no Ártico.



Como há muita gente como você que viaja de avião, anda de carro e come bife, nesse ritmo o gelo do Ártico não tem mais muito tempo de vida. E uma dupla de cientistas da Alemanha e dos Estados Unidos acaba de calcular quanto.



Dirk Notz, do Instituto Max-Planck de Meteorologia, em Hamburgo, e Julienne Stroeve, do NSIDC (Centro Nacional de Dados de Gelo e Neve), em Boulder (EUA), estabeleceram a primeira correlação direta entre emissões de gases de efeito estufa por hábitos pessoais e derretimento da camada de gelo marinho que cobre o Oceano Ártico – que abriga polo Norte, o proverbial lar de Papai Noel.



Em estudo publicado nesta quinta-feira no site do periódico científico Science, eles mostram que cada tonelada de CO2 emitida pela humanidade – cada atividade listada acima emite uma tonelada de gás carbônico – causa o derretimento de 3 m2 de gelo no Ártico. Com essa correlação em mãos, eles conseguiram produzir uma resposta plausível para uma questão que tem tirado o sono dos cientistas do clima: quando o polo Norte estará livre de gelo no verão?



O Ártico está numa trajetória de derretimento muito mais acelerada do que o previsto pelos modelos climáticos. Em 2012, a extensão mínima do mar congelado no verão, medida em setembro, foi o equivalente à metade da média verificada entre 1979 e 2000. Embora haja enorme variação natural de ano a ano, a tendência é de redução global, e o recorde de 2012 de derretimento pode ser batido a qualquer momento (em 2016 o degelo foi o segundo maior da história, estatisticamente empatado com 2007).



O glaciologista Mark Serreze, diretor do NSIDC, chamou esse movimento de “espiral da morte”: quanto mais gelo se perde, mais área de oceano fica exposta, o que aumenta a absorção de radiação solar, causando ainda mais degelo. Alguns cientistas chegaram a prever que já em 2016 o Ártico fosse estar descongelado no verão, o que tornaria possível navegar do Canadá à Rússia através do polo Norte. O IPCC, o painel do clima da ONU, estimou em 2013 que o gelo fosse durar até o meio do século.



Serreze e outros pesquisadores têm apostado que o degelo total acontecerá antes disso, dado que o Ártico real tem derretido mais depressa que o dos modelos computacionais usados pelo IPCC.



Em seu estudo, Notz e Stroeve espertamente saltaram a polêmica. “Achamos importante comunicar que não há um ano específico no qual o gelo some, mas apenas uma quantidade específica de CO2”, disse Notz ao OC. E essa quantidade específica foi estimada em algo em torno de 1 trilhão de toneladas –o mesmo que a humanidade ainda pode emitir neste século para evitar que o aquecimento global ultrapassa 2oC.



“Não podemos dar um ano concreto, já que não sabemos quais serão as trajetórias de emissão no futuro”, prosseguiu o cientista alemão. Para os níveis de emissão atuais, de 35 a 40 bilhões de toneladas de CO2 por ano, nosso estudo sugere que o gelo marinho desapareça por todo o mês de setembro em menos de 30 anos.”



Para chegar a esse número, a dupla olhou as séries de dados dos modelos climáticos do IPCC, na tentativa de entender por que estes não conseguem replicar o comportamento real do gelo e como chegar a uma previsão mais acurada.



Eles se deram conta de que, em todas as simulações dos modelos, o gelo no Ártico estava relacionado de forma linear ao aumento da temperatura. “Como nós sabíamos pelo último relatório do IPCC que a média de temperatura global está relacionada linearmente às emissões de CO2, tivemos a ideia de testar a relação entre o gelo e o CO2”, conta Notz. Cientistas costumam ter um momento de “eureca!” quando esbarram em uma nova boa ideia. Para Notz e Stroeve, estava mais para um momento de “doh!” “A relação era muito óbvia depois que nós a estabelecemos”, relata.



A conta é simples: 1 tonelada de CO2 por 3 metros quadrados igual a 100 mil quilômetros quadrados por 35 bilhões de toneladas de CO2 – é mais ou menos a perda verificada anualmente no Oceano Ártico. A dupla alerta que trata-se de um número conservador, já que ele se refere às médias mensais para todo o mês de setembro. Isso ocorrerá muito depois do primeiro verão sem gelo no polo.



O estudo tem um porém, que Notz admite ainda não entender: a quantidade real de gases de efeito estufa emitida por ano pela humanidade (52,7 bilhões de toneladas de CO2 equivalente em 2014) é bem maior que as 35 bilhões de toneladas computadas pela dupla. Este último número equivale apenas às emissões de CO2, por energia, que é o que a maior parte dos modelos captura. Segundo o cientista, por razões que ainda não estão claras, esses fatores adicionais de emissão não fazem grande diferença no comportamento do gelo.




O outro lado da moeda é que o estudo também mostra que o polo Norte pode ser mantido gongelado: basta reduzir emissões. “Para emissões cumulativas totais compatíveis com alcançar a meta de aquecimento de 1,5oC [do Acordo de Paris], ou seja, para emissões significativamente menores do que 1 trilhão de toneladas, o gelo marinho no Ártico tem uma chance de sobrevivência no longo prazo, ao menos em algumas partes do Oceano Ártico”, escreveram os autores.

Acordo de Paris agora é lei!



04/11/2016

Leia nota do Observatório do Clima sobre a entrada em vigor do novo acordo do clima, em 4/11/2016

Foto: Wikimedia Commons
Foto: Wikimedia Commons
O Acordo de Paris contra a mudança do clima entrou em vigor nesta sexta-feira. De hoje em diante, ele é lei em todos os países que o ratificaram. Cada cidadão, governo, empresa e organização da sociedade civil torna-se hoje legalmente comprometido com a tarefa de estabilizar o aquecimento global em bem menos de 2oC em relação à era pré-industrial e fazer esforços para limitá-lo a 1,5oC.



“O acordo do clima passa a vigorar quatro anos antes do prazo oficial de 2020. Em vez de enxergar isso como oportunidade para adiar sua regulamentação até lá, os governos do mundo inteiro precisam correr para deixá-lo plenamente operacional bem antes disso”, disse Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima.



“Todas as grandes economias precisam desde já ampliar radicalmente suas políticas climáticas já adotadas para 2020 e anunciar o aumento da ambição de suas Contribuições Nacionalmente Determinadas já em 2018. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente acaba de dizer que, se esperarmos até 2020 para agir com ambição, fecharemos a porta para o objetivo de 1,5oC – e condenaremos vários países e ecossistemas à extinção.”



“Para o Brasil, está na hora de implementar Paris a sério dentro de casa”, disse André Ferretti, gerente de Estratégias de Conservação da Fundação Grupo Boticário e coordenador-geral do Observatório do Clima. “Isso inclui evitar retrocessos como a volta do carvão, ir muito além dos compromissos declarados e entender que cortar emissões faz bem para a economia. Desmatamento zero, eficiência energética, 100% de crédito agrícola para sistemas produtivos eficientes, bioenergia e construção de cidades resilientes não são apenas a coisa certa a fazer pelo clima: são também instrumentos de desenvolvimento, geração de empregos e promoção de qualidade de vida.”


Viva o Acordo de Paris. Mas não há tempo de comemorar: a hora é de agir.



Observatório do Clima

Governo prepara decreto que ameaça Mata Atlântica, denunciam ambientalistas



Esta notícia está associada ao Programa: 
Em carta, Rede de ONGs afirma que Serviço Florestal Brasileiro está discutindo proposta para permitir a exploração do pouco que restou do bioma mais desmatado do país. ISA assina documento que reivindica mudança de orientação

Uma oficina promovida pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB), subordinado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), em Curitiba (PR), há algumas semanas, deixou os ambientalistas em alerta. A Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA) publicou uma carta ao ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, criticando o evento, cujo objetivo, segundo o SFB, teria sido debater uma proposta de decreto para regulamentar o manejo florestal comunitário. O ISA faz parte da rede e também assinou o texto.
Fragmento de Mata de Araucárias em São Paulo   
O documento denuncia que, na verdade, o governo estaria “agindo no sentido de reabrir a exploração comercial de espécies da flora da Mata Atlântica, bioma mais ameaçado do país”. A rede também avalia que permitir esse tipo de atividade no bioma não tem “qualquer amparo legal, não possui justificativa técnico/científica dado a reduzida área remanescente do bioma e a situação limite, em termos de viabilidade ambiental, de suas espécies vegetais” (leia a carta).


“Os madeireiros e os ruralistas em geral nunca deixaram de pleitear o manejo comercial. E quando eles falam em manejo comercial, falam em uma meia dúzia de espécies, todas ameaçadas de extinção: é Pau Brasil, Jequitibá, Araucária, Canela Preta, Xaxim, etc”, explica Wigold Schaffer, do conselho da Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida (Apremavi), de Santa Catarina, que faz parte da RMA. Schaffer publicou um artigo relatando o caso.


Em entrevista ao ISA, Carlos Eduardo Sturm, diretor de Fomento e Inclusão Florestal do SFB, negou que o MMA pretenda liberar o manejo comercial de árvores da Mata Atlântica e diz que tudo não passou de um “grande mal-entendido”.


O temor dos ambientalistas, no entanto, é que uma nova regulamentação do manejo, independente de seu caráter “comercial” ou “comunitário, abra brechas para que criminosos possam “esquentar” madeira retirada ilegalmente com documentos de planos de exploração autorizados pelos órgãos ambientais, como já foi comum na Mata Atlântica e hoje é regra na Amazônia.


Paulo Castella, engenheiro agrônomo da Secretaria de Meio Ambiente (Sema) do Paraná, participou da oficina e mostra-se preocupado com a possibilidade de se ampliar a exploração de espécies na Mata Atlântica. “Nos resta [no Paraná] menos de 1% de floresta em estágio avançado [de regeneração]. Como você vai fazer manejo florestal numa área que mal consegue manter seus processos ecológicos?”, questiona.



Ele diz que o evento em Curitiba foi uma surpresa. “Nós não sabíamos até uma semana antes de acontecer a oficina”. Segundo ele, foi dito na atividade que a ordem para a elaboração do decreto partiu dos estratos superiores do governo. Não ficou claro, porém, de onde exatamente.
Araucárias no Parque Nacional de Aparados da Serra (RS)

Polêmica

De acordo com pesquisadores e ambientalistas, o tema já é suficientemente regulamentado pela Lei da Mata Atlântica (11.428/2006) e não seria necessário um novo decreto. A norma proíbe a exploração florestal comercial e prevê a possibilidade do corte de árvores apenas por populações tradicionais e pequenos produtores rurais, fora de Áreas de Preservação Permanente (APP), para atividades de utilidade pública, pesquisas científicas, com propósitos preservacionistas e, em alguns casos, para a execução de atividades minerárias.



“A lei pegou, está fazendo seu efeito e dando uma chance para a Mata Atlântica que restou recuperar sua estrutura de espécies”, diz Schaffer. “A queda [no desmatamento] acelerou bastante após a aprovação da lei, em 2006. Na maioria dos estados, a queda é superior a 90%”, menciona. Para o ambientalista, se o manejo for liberado, toda a luta feita até hoje para recuperar o bioma pode ir por água abaixo.



“Eles dizem que o decreto vai ser nacional com base no Código Florestal. Aí que entra o problema: o Código Florestal é uma lei posterior à Lei da Mata Atlântica, que proíbe o manejo. O Código Florestal permite. Alguns querem fazer prevalecer o Código Florestal sobre a Lei da Mata Atlântica”, acusa.


 “Tanto a Constituição quanto a jurisprudência no Brasil diz que qualquer lei especial não perde sua vigência quando entra em vigor, mesmo posteriormente, uma lei geral, que é o caso do Código [Florestal]", explica. Schaffer argumenta ainda que o Código Florestal não alterou o artigo da Lei da Mata Atlântica relacionado ao manejo florestal. “Não há como, legalmente, autorizar manejo [na Mata Atlântica]”, assegura.


Carlos Eduardo Sturm garante que a regulamentação que está sendo construída não vai modificar o que é previsto na Lei 11.428/2006. Em nota, o SFB reconheceu, porém, que o objetivo da discussão é construir uma regulamentação com base no Código Florestal. O texto informa ainda que oficinas semelhantes foram feitas no Amapá, Acre, Amazonas, Pará e Bahia.

A condição crítica da Mata Atlântica

A situação da Mata Atlântica é crítica: restam apenas 12,5% de remanescentes florestais com área acima de três hectares. O índice cai para 8% com áreas com mais de 100 hectares. Os dados são do Atlas de Remanescentes Florestais da Mata Atlântica, produzido pela SOS Mata Atlântica e pelo Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) (veja mapa abaixo).


Segundo a publicação, os estados que mais tiveram desmatamento acumulado, desde 1985, foram Paraná, Minas Gerais e Santa Catarina. O Paraná teve 456 mil hectares desmatados nos últimos 30 anos; Minas teve 283 mil hectares; e Santa Catarina registrou 283 mil hectares.


Um exemplo da situação é dado pela árvore símbolo do Sul do país: a Araucária. De acordo com o último levantamento da Fundação de Pesquisas Florestais do Paraná (Fupef), de 2001, só restava 0,8% de áreas das florestas caracterizadas pela presença do Pinheiro do Paraná (Araucaria angustifólia) no estado em boas condições de conservação.

STF condena Ibama a reflorestar Mata Atlântica em Santa Catarina


Por Sabrina Rodrigues
O Ibama autorizou o corte e o transporte de Araucárias em Santa Catarina. Foto: Galante86/Flickr
O Ibama autorizou o corte e o transporte de Araucárias em Santa Catarina. 

Foto: Galante86/Flickr.


O Supremo Tribunal Federal (STF) condenou o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) a reflorestar áreas devastadas da Mata Atlântica em Santa Catarina. A decisão reconheceu que o órgão federal agiu de forma ilegal autorizando o corte e o transporte de Araucária no Estado. A extensão total e os locais do reflorestamento serão definidos pelo Judiciário. 


Entende-se que a recuperação florestal deva equivaler, no mínimo, ao valor total de mercado das árvores extraídas com autorizações desde 1993, pois foi a partir desse ano que entrou em vigor o Decreto nº 750, que proibia “a exploração de vegetação que tenha a função de proteger espécies da flora e fauna silvestre ameaçadas de extinção”.


Em 2006, o Decreto nº 750 foi substituído pela Lei da Mata Atlântica (11.428/2006) e pelo Decreto 6.660/2008, que a regulamenta. A decisão do STF finaliza uma briga entre o Instituto SocioAmbiental (ISA) e o Ibama que durou 16 anos. A sentença transitou em julgado, não permite recurso.



Fonte original: Instituto Socioambiental

Crise hídrica no DF força construção da represa do Bananal

RB AMBIENTAL




Posted: 06 Nov 2016 06:00 AM PST
Com capacidade para atender 170 mil moradores, obra próximo ao Parque Nacional de Brasília deve ficar pronta em um ano e vai ajudar a evitar outras crises hídricas na capital

O Distrito Federal atravessa a maior crise hídrica da história, com escassez de água nos principais reservatórios da cidade e risco de racionamento. Para impedir que o fenômeno ocorra no futuro, o governo de Brasília iniciou obras para captar, tratar e distribuir o recurso à população. Nesta sexta-feira (4/11), trabalhadores e máquinas começaram a construção do subsistema do Bananal, próximo ao Parque Nacional de Brasília. Após 16 anos, essa é a primeira grande intervenção para melhorar o abastecimento no DF. A última barragem construída foi na Bacia do Pipiripau.

A novidade vai custar aos cofres públicos cerca de R$ 20 milhões e deve ficar pronta em um ano. O Bananal levará água para moradores do Plano Piloto, do Cruzeiro e do Lago Norte — 170 mil ao todo. Com capacidade de vazão de 726 litros por segundo, a bacia desafogará o reservatório de Santa Maria, responsável pelo abastecimento dessas três regiões administrativas.


Os engenheiros dividiram a obra do Bananal em três etapas. A primeira vai erguer um sistema de captação de água ao lado do ribeirão de mesmo nome. Na sequência, serão construídas duas estações de bombeamento. Elas injetarão água em adutoras existentes. O trabalho inicial consiste em escavar e limpar o terreno. Em dezembro, começam as fundações.

O presidente da Companhia de Saneamento Ambiental do DF (Caesb), Maurício Luduvice, destacou que o novo sistema de captação significará mais segurança hídrica aos brasilienses, mas ressaltou a necessidade de os moradores continuarem com a política de redução do consumo. “Mesmo depois de os subsistemas do Bananal e de Corumbá ficarem prontos, é fundamental que as pessoas tenham consciência da necessidade de preservar o recurso hídrico”, alertou.

Sistema Produtor Corumbá IV
Além do subsistema do Bananal, outra obra em curso para dar mais tranquilidade ao abastecimento de Brasília é a construção de sistema de captação e distribuição de água na barragem de Corumbá IV, próximo a Luziânia (GO), que conta com investimentos do DF, de Goiás e do governo federal. A previsão é que o aquífero fique pronto em 2018. A água captada nele servirá a brasilienses e goianos.

A Caesb ainda tem um projeto para captar, armazenar, tratar e distribuir água do Lago Paranoá, que está licitado, mas aguarda a liberação de um recurso da União para o início das obras. Quando ficar pronto, o Sistema Paranoá atenderá cerca de 600 mil moradores do Paranoá, de São Sebastião, do Lago Norte, de Sobradinho, de Sobradinho II, dos condomínios do Grande Colorado e de Planaltina.

Fonte: Agência Brasília / RaioXDF