“É claro que no Paraná (caso André Vargas) um delegado (da polícia federal) vazou informações…”
 
“Vazamentos da Petrobrás? Não sei… aí já é com delegados, o material passa pelos agentes, mas não foram agentes que vazaram. Não são agentes, escrivães e papiloscopistas que estão vazando informações…Se estão vazando, não somos nós…”
 
“(…) fizemos campanha para o governo desde 2002, e somos leais ao governo. Já os delegados, não. Delegados fizeram campanha e são ligados ao PSDB…”
 
“O que ouço de colegas é que se o governo não resolver (a questão salarial na Policia Federal) corre-se o risco de que possa haver vazamentos de informações que estejam sobre segredo de justiça, que ainda estejam sob investigação, ou que o devido processo legal não tenha sido concluído”. 
 
“(…) da nossa parte, dos agentes, escrivães e papiloscopistas, não estamos vazando, mas, sim, há insatisfação, irritação, há ameaças de colegas, e quando pergunto sobre o que seria (vazamentos) me dizem que eu vou saber “depois que tiver sido publicado na imprensa”.  
 
As afirmações e informações acima são de Jones Leal, presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (FENAPEF), com quem Terra Magazine conversou no final da noite deste domingo, 27, por telefone.
 
Há uma crise interna na Polícia Federal, acompanhada há meses por Terra Magazine.  
 
Segundo alguns dos personagens, crise que além da PF chega ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ao qual a corporação está hierarquicamente submetida, e crise que passaria por decisões da presidente Dilma Roussef.
 
Os capítulos mais recentes dessa crise começaram a se delinear numa campanha salarial, já há três anos. De um lado, agentes, escrivães e papiloscopistas. De outro, delegados e o governo Dilma. 
 
Antes de ser salarial, a crise é estrutural, e antiga. Vinha sendo gestada ainda durante a Operação Satiagraha, e explodiu de vez na madrugada em que foi preso o banqueiro Daniel Dantas, na terça-feira 8 de julho de 2008. Desde então, por um motivo ou outro, seguem as divisões e embates internos na PF.
 
Segundo funcionários da própria corporação, integrantes da Polícia Federal seriam responsáveis pela enxurrada de vazamentos nas últimas semanas.
 
Vazamentos, como sabe qualquer repórter, são comuns, e em grandes investigações costumam ter como origem principal o ministério público.  
 
 
De posse desta e outras informações, Terra Magazine ouviu o presidente da FENAPEF. Questionado a respeito, Jones Leal disse:
 
- Afirmo que agentes, escrivães e papiloscopistas não estão vazando, se há vazamento é do outro lado, o dos delegados.
 
(Em tempo. O agrupamento ao qual Jones Leal se refere tem mais de 10 mil integrantes. Os delegados são, aproximadamente, 2 mil. Na ativa, a PF tem mais de 14 mil funcionários.) 
 
Jones Leal informou também:
 
- Nós, agentes, escrivães e papiloscopístas fizemos campanha para o governo desde 2002, e somos leais ao governo. Já os delegados, não. Delegados fizeram campanha e são ligados ao PSDB.
 
No início da campanha salarial em questão o governo ofereceu aumentos diferenciados: 15,8% para agentes, escrivães, papiloscopistas e delegados especiais, de 1ª e 2ª classe. E 25,8% para os delegados de 3ª classe. Aumento  a ser pago ao longo de 3 anos, até janeiro de 2015, de forma escalonada.
 
Agentes, escrivães e papiloscopistas não aceitaram e, desde então, têm feito manifestações país afora. Uma das mais recentes, e que elevou a temperatura da crise, se deu na Academia Nacional de Polícia, no Dia da Polícia Federal, em 28 de Março último.
 
Agentes e delegados dizem a Terra Magazine que há meses impera um ambiente de “caos”, com cumulativos casos de “insubordinação” diante de delegados. O presidente da FENAPEF ensaia negar e diz haver “tensão”. Não é o que mostra, e deixa evidente, esse vídeo.
 
 
Gravado pelos próprios policiais no 28 de Março, no 70º aniversário da Polícia Federal, e na presença do Diretor-geral da PF, Leandro Daiello, o vídeo flagra manifestação que escancara a crise: instrutores da Academia Nacional da Polícia, em Brasília, se recusando a cantar o hino da corporação.
 
Como se vê no vídeo, dezenas de policiais abaixam a cabeça e protestam com o silêncio e braços cruzados enquanto a banda dos fuzileiros navais executa o hino e colegas cantam:
 
- …Nosso lema é servir bem servido/Preservando o direito e a ordem/Este povo feliz e aguerrido/ Que abjura com horror a desordem…
 
Na reação à manifestação, considerada uma “afronta” pela direção da Academia e da Polícia, mais lenha na fogueira. 
 
Entre as dezenas que se manifestaram estavam integrantes da corporação que davam curso na Academia Nacional de Polícia. De acordo com Jones Leal, 16 agentes, escrivães e papiloscopístas foram afastados da função de professor. 
 
Os que não são lotados em Brasília foram mandados de volta para seus estados, enquanto os demais retornaram às funções originais.
 
Antes desse capítulo, um outro, na aula inaugural da Academia neste ano. 
 
Então, segundo Jones Leal, o ministro da justiça, José Eduardo Cardozo, teria feito discurso em “que passava uma mensagem ao sindicalismo nas entrelinhas”. O presidente da FENAPEF avalia:
 
-A repercussão não foi boa.
 
De fato em fato, ou boato em boato, a crise chegou ao Palácio do Planalto. Quem relata é o presidente da FENAPEF:
 
 -Recebemos informação extra-oficial de que a presidenta Dilma teria ficado chateada com uma das nossas manifestações, e dito que nós ficaríamos de castigo nos próximos quatro ou cinco anos, para que aprendêssemos uma forma diferente de negociação…e isso se espalhou…
 
Nessa crise há fatos e há boatos. Há fatos que Jones Leal confirma, como se vê, e há os que ele nega. 
 
Agentes e delegados garantem: na Rio-20, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, em junho de 2012, alguns agentes teriam feito discreta manifestação no aeroporto do Galeão e no Riocentro, quando do desembarque de autoridades estrangeiras. O que teria exasperado a presidente Dilma. Jones Leal nega:  
 
- Outras manifestações ocorreram, mas essa, não aconteceu…
 
Não teria ocorrido, segundo o presidente da FENAPEF, porque dias antes a Federação e o ministro da Justiça assinaram um compromisso:
 
 -O presidente da Federação ainda era o Marcos Wink, e assinamos o compromisso de não fazer manifestações durante a Rio-20.
 
O dia 2 de abril foi a última data legal para a concessão de aumento salarial, por ser esse um ano eleitoral. Há quem diga não haver como dar o reajuste que agentes e demais carreiras da PF não aceitaram, o que faria a crise se espraiar pela temporada de Copa do Mundo e eleições.
 
O presidente da FENAPEF não nega essa perspectiva, mas entende que o prazo ainda não se esgotou, e seria outro:
 
-A lei permite uma reestruturação de carreira a até 90 dias das eleições, e o que teríamos não seria um aumento salarial e, sim, uma reestruturação nas carreiras de agentes, escrivães e papiloscopistas.  
 
Antes do dia 2 de abril, a presidenta Dilma recebeu informações, externas ao governo, da evolução e gravidade do que se espraia pelos bastidores.
 
 Quanto aos vazamentos, o presidente da FENAPEF reafirma:
 
-Os agentes, escrivães e papiloscopistas, que somos uns dez mil funcionários, não estamos vazando…mas sei também, ouço de colegas insatisfeitos, que tem gente querendo jogar no ventilador, mesmo o que ainda não tenha sido submetido ao devido processo legal…
 
Terra Magazine perguntou a Jones Leal, presidente da FENAPEF:
 
-Mesmo o que ainda não tenha sido devidamente investigado, checado, mesmo que seja apenas uma referência, uma citação de nomes? Até isso foi, seria ou será objeto de vazamentos nessa crise? 
 
-Repito que da nossa parte, dos agentes, escrivães e papiloscopistas, não estamos vazando, mas, sim, há insatisfação, irritação, há ameaças de colegas, e quando pergunto sobre o que seria (vazamentos) me dizem que eu vou saber “depois que tiver sido publicado na imprensa”. 
 
A direção da Polícia Federal e o ministro da Justiça foram procurados por Terra Magazine para se pronunciarem a respeito dos temas acima tratados.
 
A PF, depois de contato telefônico, pediu que fosse enviado um resumo da pauta, o que foi feito ainda na manhã desta segunda-feira, 28, às 11 hs e 12 minutos Até o fechamento desta reportagem, Terra Magazine não havia recebido resposta da Polícia Federal.
 
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, conversou na tarde desta segunda com o Terra Magazine sobre esta reportagem e comentou as declarações do presidente da FENAPEF. Para Cardozo, "quem vazar informações na PF será punido".