sexta-feira, 18 de outubro de 2013

"O único verde que conta em Brasília é o verde do dinheiro!"

"Confusão fundiária
A despeito da aparente qualidade de vida de Brasília, um verdadeiro caos fundiário existe no Distrito Federal. Com a criação da nova unidade federativa, grande parte das terras pertencentes ao governo de Goiás foi repassada às companhias imobiliárias e de desenvolvimento do Distrito Federal. O documento, no entanto, não é claro em definir os limites de diversas propriedades. Muitos dos antigos proprietários não foram localizados, nem indenizados. E se formou um grande imbróglio fundiário no Distrito Federal.
A ausência do controle do poder público sobre a ocupação do Distrito Federal era patente nas décadas de 70 e 80. No entanto, a partir dos anos 90 em diante, especialmente com o crescimento das cidades e a especulação imobiliária, começaram a entrar em operação as derrubadas, associadas ao intenso parcelamento e venda de terras putativamente públicas. O valor da terra no Distrito Federal valorizou-se de forma absurda e sedimentou-se a cultura da especulação imobiliária candanga.
Terras públicas, lucro privado
brasilia-panoramicaA capital cresce acelerada sobre o Cerrado. Foto: Leandro Neumann Ciuffo/Flickr
Mas algo interessante ocorre no Distrito Federal. Devido a imprecisões de documentações antigas, a Companhia Imobiliária do Distrito Federal, Terracap, não parece saber exatamente onde estão e quais são suas terras. No entanto, devido ao valor do solo no Distrito Federal, a Terracap (hoje endividada devido às obras do novo estádio de futebol da cidade) propaga a informação de que a maior parte das terras do Distrito Federal é pública e pertencem a ela. Por outro lado, a Terracap é bastante singular. Uma parte do valor das vendas de terras públicas no Distrito Federal é repassada aos seus servidores como participação nos lucros. Ou seja, vendem terras públicas e transformam em ganho particular. Com isso também se cria a cultura institucional da especulação imobiliária. Para muitos servidores do Governo do Distrito Federal, é melhor investir na valorização da terra (e vendê-la a preços inacessíveis) que tomar as rédeas do conflito fundiário do Distrito Federal e garantir moradia à população e um planejamento responsável no uso do solo. E no meio desta confusão, estão diversas áreas protegidas que lutam em desvantagem contra o parcelamento do solo e a insularização provocada pelo avanço de uma matriz agressiva.
Na mira, áreas protegidas
Os olhos de cobiça se erguem agora sobre o conjunto de áreas protegidas formadas pela Estação Ecológica do Jardim Botânico, da Reserva Ecológica do IBGE e da Área de Relevante Interesse Ecológico do Capetinga/Taquara, gerenciada pela Fazenda Água Limpa da Universidade de Brasília. Uma nova cidade para 950mil pessoas está planejada para ser instalada em uma área de 17 mil hectares de Cerrado, vizinha a este conjunto de áreas protegidas. Além do desmatamento para a instalação da cidade em si, querem rasgar estas áreas protegidas por uma rodovia. Como existem Unidades de Conservação distritais nesse conjunto de áreas, tenho certeza que a luta pela manutenção da integridade desse valioso bloco de Cerrado, terá resultados desastrosos, independentemente dos anseios da sociedade.
O único verde que conta em Brasília é o verde do dinheiro. Existe muito interesse em jogo. Como resultado da insensibilidade do poder público na política habitacional, mais de 600 mil famílias no DF não possuem escritura da moradia, mas pagam todos os impostos e aguardam o momento da sonhada regularização, mesmo temendo o custo do solo a ser estipulado pela Terracap. Faz parte da estratégia de especulação governamental do DF a demonização de pessoas que habitam hoje terras putativamente públicas. Hoje percebo que muitas destas famílias foram empurradas para algumas dessas áreas pela impossibilidade de adquirirem moradia em uma cidade aonde o metro quadrado já chegou a ser vendido a mais de 12 mil reais em imóveis ainda na planta. Resultado do repasse do custo dos terrenos vendidos pela Terracap às construtoras para o consumidor final. E a violência contra essas famílias durante as operações de derrubada servem apenas atender a interesses de grandes especuladores.
Que chance teria o elusivo candango em uma realidade desta? Como as áreas protegidas do DF conseguirão sobreviver se o próprio governo as enxerga apenas como um metro quadrado valioso no mercado imobiliário? O Juscelinomys candango foi o primeiro a desaparecer. Vão-se os pobres candangos, mas outros ratos prosperam"...

Reuber Brandão - 16/10/13